Kentin estava parado na porta. Os olhos, que se flexionaram para analisar a posição em que Nath e eu estávamos, relaxaram em segundos e logo estavam fixos ao lado de um sorriso. Ele andou em direção a Nathaniel e colocou os dedos em seu ombro,mas mantendo distância do meu corpo na maca.
   
       - Vejo que está bem, Emery. Fico feliz que já superou o acontecimento.- Disse, com o tom neutro e amargo, cortante como vidro.
      - Sim, Nath e os demais sempre vêm me visitar quando podem. Isso ajuda muito na melhora e logo terei alta. Sabe como as coisas são, Kentin: Quando realmente se preocupam, pessoas  cuidam e não machucam.  - Respondi, usando minhas palavras para estapeá-lo. Pude ver o seu peito descer e subir irregularmente, ofegando.- Soube de você e Ambre. Meus parabéns, fico feliz!
      - Obrigado, Emery! Temos que dar valor antes de perder. Isso deve ser familiar para você.

     E era. Ken referia-se ao fato de nunca ter dito nada sobre o que sentia por ele, mesmo sabendo que ele sentia o mesmo, que era mútuo. A sensação de ouvir aquilo foi como ter pequenas agulhas enfiadas na minha garganta, furando lentamente minhas artérias, veias e nervos.
     
      - Vou deixar que conversem com calma. Tenho que ir embora já que tenho alguns relatórios da classe para fazer.- Disse Nath, quebrando o silêncio da sala. Ficou de pé, beijou minha testa e saiu, despedindo-se de Ken com um leve aceno de cabeça; formal e gentil.
       
     Ken olhou-me como se buscasse uma solução. Nunca vi aquela expressão fria e dura em seu rosto, capaz de me atravessar como uma lança afiada faria.
 
    - Você sabe, Emery! Sabe que não amo a Ambre, Eu lhe disse que era parte do meu plano e...
    -Não precisa terminar, Kentin! Qual o fundamento desse plano? Deixá-la zangada quando você lhe dar uma blusa barata no aniversário de namoro? Quer mesmo que eu te espere enquanto você beija outra garota? Não seja tão egoísta!
    - Você é a egoísta , garota! Você que não aguenta ser abandonada e já sai procurando outro namorado!
    - Eu e Nathaniel somos amigos. Estávamos apenas juntos como qualquer pessoa normal poderia ficar. Não sou desse tipinho que troca de namorados quando quer!
    - Inventa outra! Você só quer atenção e todos sabem disso. Por isso que você se jogou na frente de um carro! APENAS PARA GANHAR ATENÇÃO!

       E novamente tive o corpo perfurado. Não por agulhas, mas por facas capazes de dilacerar membros apenas com um deslizar de lâmina! Faltou oxigênio no ar, como se estivesse me estrangulando de forma linda, dolorosa e lenta. Quando voltei a mim, minha voz estava fraca.
    -Então é isso que pensa de mim? Sou a garota que só quer atenção? Que se atirou na frente de um carro?
    - Emery, eu...
    - Chega, Kentin! Vá embora agora e não volte!
    - Não, não vou sair daqui enquanto não me deixar explicar. Não foi minha intenç...
    - Então saiu eu!

      E me levantei, batendo a porta e correndo pelos corredores e escadarias. Ainda possuía sequelas do acidente e Ken facilmente iria me alcançar, mas o sentimento de tristeza e ódio que se contorcia dentro de mim era incontrolável e, portanto, consegui despistá-lo. A euforia me envolveu, guiando-me às cegas e quando percebi, havia acabado de chegar ao jardim pelas portas do fundo.
      Aquele ambiente não era estranho de certo modo. As flores, os cheiros, a maneira de que as plantas estavam organizadas... tudo me lembrava o clube de jardinagem onde conheci Jade. Sacudi a cabela, me livrando do entorpecimento causado pela lembrança e concentrei-me no azul do céu.

          Acordei com um toque  no meu braço direito. A mão era firme e quente, como carvão em brasa. O dono obviamente, era Castiel, que me encarava com uma expressão curiosa; a pele branca e pálida em contraste com as labaredas do cabelo vermelho.
   - Emery, desculpe te acordar, mas... preciso conversar com alguém. Sabe, eu também tenho coração, mesmo sendo mais duro que o da maioria!- E sorriu, fazendo-me rir junto.
   - Nunca duvidei disso, Castiel. Está tudo bem? Aconteceu algo?
   - Estou com um problema, e o nome dele, ou melhor, dela, é Inkas!
   - Bem, - me endireitei na maca e puxei-o para perto, deixando que senta-se na cadeira de visitantes ao meu lado.- Estou aqui, pode começar quando quiser!
   -Vou te contar uma história:
Eu e Inkas fomos ao parque. Estava nevando e a água do lago estava congelada, com patinhos escorregando alegres pelo gelo fino. Ela sempre foi corajosa e tomou a iniciativa, pegou a minha mão de forma firme e encaixou-a no bolso do casaco junto a dela porque eu estava sem luvas. Ela sorriu, e, mesmo tímida, conseguiu me fazer corar. Isso nunca havia acontecido antes, NUNCA HAVIA CORADO COM UMA GAROTA E...
   - Calma,- interrompi-o, - não há nada demais nisso. Enquanto for vivo e sangue circular nas suas bochechas, você vai corar, Cast!
   - A questão não é essa Em's, você vai entender! Continuando, eu e Inkas passamos em frente a uma barraca de flores, e comprei algumas margaridas para ela. Ela carregou o buquê como se fosse feito de ouro maciço e não pude evitar algumas risadas quando ela tropeçava em alguns degraus da escadaria do parque. Sentamos em um banco, perto de alguns pinheiros com folhas presas em flocos de neve e ela começou a rir sozinha. Quando perguntei o que havia acontecido, disse que meu cabelo era como tomates e eu ri muito daquilo. Sempre gostei da maneira que ela vê o mundo.
   " Já que estava tarde, ela resolveu ir embora, mas já que mora a algumas quadras de onde estávamos, não permitiu que eu fosse com ela. Estávamos saindo do parque quando, de repente, não me segurei e beijei-a. Eu precisava sentir aquele hálito doce, tocar aquele cabelo verde-esmeralda e saber que ela era minha e de mais ninguém. Pensei que ela iria me empurrar com aqueles dedos pequenos, mas ela me correspondeu, com um desejo voraz e claro. Nossos lábios se mexiam como se fosses as duas últimas  peças perdidas de um quebra-cabeça e no entanto, depois de perceber que  por mais que desejasse a essência do outro, também necessitava de oxigênio, nos afastamos. Apenas o suficiente para ar entrar nos pulmões, mas negando tirar minhas mãos de sua cintura. "Tenho que ir, Cast!", e assim ela se foi, sem nem mesmo um "até logo!". - Emery, acho que estou pirando! Não sei se ela me ama ou se está jogando comigo. O QUE EU FAÇO?
       - Simples, Castiel: Peça Inkas em namoro! É claro que ela te ama e você também sente o mesmo por ela, e nem tente negar!- Sorri para ele.- Amor não é um problema, é uma solução! Agarre-a!
       - Obrigado, Em's.- Ele beijou minha mão- Ainda bem que tenho você aqui comigo, irmanzinha! haha- Agora tenho que ir! Fica bem logo, tá?
       -Ok, Castiel! Volte logo e traga NOSSA Inkas junto.

     Castiel foi embora. Pensei vagamente na história e escrevi em um pedaço de papel a fórmula:
   
                      margaridas + Cabelo de tomate +  pitada de Inkas = Amor

     Acho que isso serve para mim! Enquato vagava pelo quarto, alguém bateu na porta. Pedi que entrasse e Nathaniel surgiu, com uma blusa verde e calças jeans azul claro. Ele veio em minha direção e, como o de costume, endireitou-se ao meu lado da cama, deixando me envolvida em seus braços como fazia desde quando acordei, há uns 4 dias atrás. Estávamos próximos, de maneira que Nath me iluminava como o Sol faz com a Terra. Conversamos alegremente e, cansada, repousei minha cabeça em seus ombros e minha mão em seu peito. Continuaria assim, mas a porta se abriu e, pensando que era novamente o médico, nem nos separamos. Mas não era o doutor. Quem estava parado, fixando o olhar em nossos corpos alinhados era Kentin.
 
 

 Haviam espinhos em toda a parte. O sol estava brilhando fraco e aos poucos ia se desfazendo, como feito de migalhas. Este então é o fim do mundo?, pensei, mas antes que concluísse a linha de raciocínio, um zumbido feroz cortou o ar, indicando que algo se aproximava. No horizonte, uma forma negra apareceu e, em alta velocidade, tomou forma: um carro. Quando me preparei para correr, percebi que não conseguia mexer minhas pernas, mas já era tarde; o carro estava bem na minha frente e....
             Acordei. Estava deitada em uma maca hospitalar branca, assim como todo o quarto. Na cabeceira, haviam rosas vermelhas com um bilhetinho assinado com a caligrafia de Mary. No sofá, havia um garoto de cabelos lisos e loiros dormindo. Nath,pensei, O que está fazendo aqui? Ia me levantar e acordá-lo com um abraço, mas uma onda de dor surgiu na costela e percorreu meu corpo, fazendo-me gemer. Creio que o som roco de minha garganta foi mais alto do que o esperado, já que Nathaniel acordou e, apressadamente, levantou e se sentou ao meu lado.
            Ele me olhou com intensidade, os cabelos desgrenhados, o pulso firme e a boca rígida. Pareceu ouvir as dúvidas em minha cabeça, como se eu as tivesse dito em voz alta.
            -Você foi atropelada, Emery. O motorista fugiu, mas você vai ficar bem e é isso que importa.- Tocou de leve a minha mão, como se eu fosse um vaso frágil prestes a quebrar. Mas eu não era, e , portanto, puxei-o para um abraço apertado que, através de toda a dor que me gerou, foi a única forma de digerir todas aquelas informações. Nath sentiu o quanto eu necessitava daquilo e não me afastou, apenas me envolveu suavemente, arqueado minha cabeça em seus ombros, como um bom amigo faria.
          - Nath, quero ir embora daqui! Tenho aula e as provas estão chegando e...
           -Emery- ele me interrompeu, suave e calmo- as provas foram a dois dias atrás. Você está aqui há mais de uma semana!
          Foi como se um punhal se enterrasse entre os meu ossos. Me lembrava vagamente do que havia acontecido: A chuva caindo, meus cabelos soltos, Jade indo embora, o garotinho Luis, o farol amarelado do carro e a dor estrondosa antes da total escuridão, mas ficar inconsciente por 7 dias era demais! Nath sentou ao meu lado, e colocou uma mecha dos meus cabelos abarrotados atrás da orelha. Aos poucos, esticou-se e passou seu braço esquerdo por trás da minha coluna, deixando-me usá-lo como travesseiro.
          Ficamos assim por um bom tempo. Nenhuma palavra dita, nenhum pensamento exposto, apenas o toque do corpo e o calor que irradiava de Nath. As pessoas falavam que Castiel era como o fogo, enérgico e quente, e Nathaniel como pedra, sério e focado, mas discordo. Nath é tão brilhante quanto o Sol, ainda mais com o bronze de sua pele e o dourado de seus cabelos.
          - Estes dias, Inkas, eu, Mary e até o Castiel vieram te ver. Rosa e o Lys vão vir amanha, quando sairem da loja. Todos estão preocupados e adorarão saber que acordou.
          - E Kentin? Jade?- Perguntei, a voz fraca e inexpressiva.
          - Jade ainda não apareceu e Kentin está numa viagem com Ambre. Os dois oficializaram o namoro logo após o seu acidente. Sinto mui...
          - Não se desculpe, Nathaniel. Eu e Ken somos amigos, bem, ou fomos, e não tenho nada a ver com a vida pessoal dele. Jade também sabe se cuidar, ele vai ficar bem. Eu não sei é como eu vou ficar nessa história.
          - Você tem amigos. Alguns, como a Íris, não te visitaram por diversos motivos, mas mandaram cartões e chocolates. Estão junto com as flores de Mary. E acima de tudo, tem a mim, e nunca abandono meus amigos, ainda mais quando são como você, especias de mais pra se perder.- Suas bochechas coraram, e eu me inclinei para beijar sua testa, bem na hora em que o médico entrou pela porta:
          -Desculpe interromper- disse, claramente envergonhado- mas a senhorita Emery precisa de descanso. Poderá vê-la amanhã,e não adianta dizer, mocinha, que não quer repousar. São normas do hospital!
          E antes que eu evitasse, Nath se levantou, beijou minha bochecha e sussurrou um "Até amanha, Emery!". Parou na porta e antes de se retirar, sorriu para mim, me fazendo rir junto consigo. Tentei virar para o canto, focando o olhar nas pétalas vermelho-sangue das rosas. Adormeci logo após.
       

     Estava frio. Jade foi embora há dois longos e tortuosos dias, deixando-me aflita, sem saber onde e como estava. Além disso, haviam 2 coisas que não conseguia me livrar desde então: Pesadelos horríveis e choros frequentes. Esses pesadelos eram sempre os mesmos:
      Era noite com neve e eu andava por uma rua deserta sozinha. O céu estreladamente obscuro, chamava minha atenção e deixava-me distraída até que, atravessando uma avenida, percebo  um carro descontrolado vindo em minha direção até que, na hora que iria arremessar me aos braços da morte, alguém entrava na frente. Quando eu me virava para ver quem era, me deparava com o rosto de...
       Eu acordava sempre na hora em que iria ver a face do meu salvador. O cheiro de sangue e metal presente nos sonhos inundou minha cabeça, deixando-me zonza. Segurei em um poste ao meu lado para que não caísse no chão e continuei a caminhada. Ainda estava escurecendo, mas os últimos raios de sol que separava a noite do dia já haviam ido embora. Classic, a loja de roupas favorita de Rosa e Alexy, estava fechada. Para ser sincera, apenas o parque, lugar em que chorei por Kentin, estava aberto.
       Eu deveria conseguir, ou pelo menos tentar,esquecer Jade. Mas uma parte de mim gritava em minha cabeça exigindo que o procure e faço-o com que explique o que aconteceu para ele me abandonar. Um garotinho atravessou a rua, correndo para acompanhar os passos rápidos do pai que segurava sua mão. Era lindo, e possuía cabelos castanhos e olhos claros, realçando uma blusa escrita "Ame o Luís!"
       Observei-os irem embora e parei na enorme ponte de ferro que cortava o rio Syanna. Pequenos flocos de neve desciam, fazendo-me virar a cabeça e recebe-los com a boca. Soltei uma risada doce e psicótica, uma vez que o gosto das pequenas bolinhas brancas era gélido e provocava cócegas ao entrar em contato com a língua. Apoiei os meus braços na grade negra e esperei alguns minutos, sentindo a neve descongelar e derreter em minha pele clara. O vento soprou os meus cabelos, deslizando com o meu lenço vermelho e fazendo com que voasse até a avenida principal.
         Corri para pegá-lo e agarrei-o quando pousou no meio da rua. Eu conheço este lugar. É onde eu ia ser atro... E antes de que eu pudesse concluir a linha de raciocínio, um carro louco surgiu, avançando ao meu encontro. O farol amarelo e forte me cegou, deixando-me congelada, perdida demais para que pudesse me desviar. Era agora que alguém deveria aparecer e me salvar, mas não havia ninguém. Enquanto, as lágrimas desciam doloridas pelo meu rosto petrificado, o  carro vinha em minha direção...


          Acordei com o hálito de Jade no meu rosto. Era doce como as rosas vermelhas que tinha no jardim de sua casa. Usando delicadamente seus braços, afagou calmamente minha cintura e me levantou, deixando-me com a cabeça em seu peito. Após alguns beijos, tirei sua camisa e deitei-o sobre o meu corpo, encaixando seus braços ao contorno de minha cintura. Ainda estávamos vestidos, mas sabíamos que, mesmo se não estivéssemos, não faríamos nada de mais com apenas 2 semanas de namoro então, paramos para respirar um pouco.
         Girei, deixando meu tronco encima do seu. Tirei minha blusa de frio, percebendo o quanto que o calor da pele de Jade conseguia me aquecer, e aproximei-me para tocar seus cabelos claros. Caí ao seu lado, mãos uma sobre a outra e olhos focados no nada, como em um sonho. Ele se virou, me encarando com os olhos luminosos, e retribuí com um sorriso.
          Tempo atrás, descobri que Kentin ainda sentia o mesmo de antes por mim. As vezes me pego pensando em como seria se tivéssemos tido coragem de assumir o que sentiamos, mas afasto essas ideias, aliás, eu também estava dividida. Dividida entre flores e biscoitos, entre a estabilidade e confiança da terra e a ardência e fervura do fogo.
          Mas eu devo me lembrar de que o plano, ou melhor, o sacrifício de Ken para me manter protegida de Ambre ainda estava ocorrendo. Acho que mereço um pouco de paz, pois, aliás, era domingo... e dia dos namorados! Marry estava ocupada demais comprando presentes para o Lysandre e Rosa viajou com Leigh, então, iria fazer compras com o Alexy e seu ego modista refinado.
          Primeiro entramos na Hugs, loja de preços e estilos super variados. Compramos algumas coisas, tal como uma calça skinny de couro e verniz e uma blusa "cashmere" rosa-bebê. Para dar á Jade, achei um colar de ouro, de pequenas ondulações e um pingente em forma circular. Nossa foto estava dentro.Após eu pagar, Alexy me segurou pelo braço e me arrastou pelo shopping inteiro! Foi divertido passar o dia com alguém tão meigo e animado! Era tudo que eu precisava para relaxar e tirar a pressão de meus ombros.
         Quando cheguei na casa de meu namorado, tive muito cuidado para não fazer barulho e fazer uma surpresa. Subi as escadas descalças e preparei seu presente. Nenhum ruído era emitido, como se estivesse vazia.
        Passei pelo banheiro e sala, mas estavam tão vazios quanto os demais cômodos.O quarto,pensei.Assim que entrei pela porta de mármore lustrosa, o embrulho do colar caiu no chão, fazendo um som metálico e áspero. Minha expressão estava congelada em uma mistura de dúvida e terror.As gavetas estavam vazias e o guarda-roupa de Jade aberto, sem nenhuma roupa dentro... Ele havia ido embora!
         

       Kentin estava parado na minha frente e me olhava atentamente. Minha ,mão apartou a de Jade, demonstrando todo o desespero que eu sentia. Jade soltou e minha mão e se virou, indo embora. Eu queria gritar e pedir que ficasse, mas eu sabia que poderia magoá-lo muito fácil com Ken parado, sorrindo, na minha frente. Deixei-o ir.
         Encarei os olhos  brilhantes na minha frente. Cabeça erguida, esperei que ele começasse a falar. Mas ele me abraçou firme contra o seu peito, porém, empurrei-o para longe.
-Sua namorada loira não vai gostar de te ver com "garotinhas do meu nível"! O que quer?
-Emery- ele disse, mantendo um distância respeitosa- Você não entende?O que eu te disse foi apenas uma encenação. Você é minha amiga, nunca agiria assim com você a menos que precisasse! Um do lado do outro eternamente, lembra?
-Do lado do outro? Que tipo de união é esse? Que tipo de amizade e amor são esses? Não sou estúpida a chegar ao ponto de pensar que poderíamos ser como antes novamente! Vá embora!- Eu estava perdendo o controle. Sentia que estava sufocando por trás da máscara de menina forte, mas...
-Não seja tola! Prometemos ser amigos por todas as nossas vidas, lembra?
-Isso foi antes de você, Kentin, ficar com aquela cobra da Ambre. Você não tem ideia de como foi aguentar te ver quase todos os dias com ela sabendo que...- as lágrimas saíram e me engasguei- Por que fez isso?
-Eu e meus pais, como o combinado tempo atrás, nos mudamos para cá quando terminei meu treinamento militar. Semanas depois de que entrei na Sweet Amoris, soube o que Ambre havia feito com você usando as tintas e o quanto ela te odiava. Fiquei com medo dela te machucar mais e, bem, resolvi ficar com ela por você; para te proteger, Emery.
-Mentiras e mentiras!
-ACHA MESMO QUE EU FARIA ISSO COM VOCÊ? -Gritou, transformando sua voz em uma mistura de dor e descrença. Ele falava a verdade. Estava escrito em sua expressão dolorida.
- Kentin...-Disse, pasma diante meus conflitos internos. Parte de mim querendo acreditar enquanto outra insistia em desconfiar. Não sabia o que fazer. Mas minha armadura havia derretido e, por alguns momentos, eramos como antes de toda a perda e abandono.
      Nos abraçamos. Poderíamos ficar ali, imóveis por anos, mas nos separamos minutos depois. Ele tocou meus cabelos com o queixo enquanto eu alinhava minha cabeça aos seus ombros.
-Ambre não sabe onde estou. Não permita que saiba, ok Emery?
-Claro!-sorri- tenho que ir!
-Não fuja de novo!-Ele sorriu ironicamente- Lembre-se que teremos de fingir que a nossa amizade está morta!
-Eu sei! -beijei sua bochecha e caminhei para fora.-Mas não fui eu que te abandonei, certo?- Saí. Não esperava uma resposta.
       O sol já estava se pondo. Jade, sentado no banco de costas para a saída do jardim, como se esperasse que eu fosse embora sem olhar-lo nos olhos, permaneceu imóvel. Abracei-o por trás e olhei seu rosto. Estava contorcido, com lágrimas descendo pelas bochechas. Jade!, suspirei. Peguei sua mão e puxei seu corpo, deixando-o de pé.
-Achou mesmo que eu ia te deixar? Eu e Ken somos apenas amigos, está mais que comprovado que disso não iremos passar.
          Ele sorriu e me beijou de maneira rude, como se precisasse daquilo para  viver; como se eu fosse uma droga que havia deixado-o completamente viciado. Ao fundo, Kentin passou e foi embora silenciosamente, de cabeça baixa ignorando a cena por completo. Senti um aperto no meu peito, mas aliás, o que eu poderia fazer? Mal sabia eu que estava entrando em um jogo no qual sempre haveria alguém magoado...

       Jade estava deitado ao meu lado. Minha cabeça estava arqueada ao seu ombro, sendo mimadamente acariciada. Meus dedos estavam entrelaçados com os da mão esquerda enquanto eu observava a lua cheia pela janela. Queria permanecer daquela maneira para sempre... mas não podia! Eu o amava loucamente, mas também pensava em Kentin... por onde ele andaria? Estava seguro?
       Mas eu estava bem, e, sem dúvidas, o que sentia por Jade era eterno. Eu me estiquei e beijei sua testa e desci lentamente, até sentir o calor de sua boca. Ele percebeu o quanto eu estava viciada em seus toques e o quanto precisava de seus braços ao redor do meu corpo, protegendo-me das lembranças que vivi ao lado do  Ken, meu pequeno e adorado ...
         Quando acordei, estava envolvida em um cobertor branco ao lado de um pequeno bilhete.

Fui ao jardim da escola. Tenho uma surpresa para você! Te espero lá!

          Me levantei, escovei os dentes, troquei de roupas. Nunca havia dormido tanto, pois já estava na hora de ir ajudá-lo na escola ( pois era sábado)e nem café eu havia tomado. Marry disse aos meus pais que iria dormir na casa de Inkas para que então, eu viesse ficar com Jade. Sabíamos que ele, como aqueles cavalheiros da época de Romeu e Julieta,  me respeitava e não faria nada sem a minha permissão.
          Quando cheguei na Sweet Amoris (que era bem pertinho da casa dele), fui direto ao clube de jardinagem. Quando entrei, me deparei com um pé de rosas azuis maravilhoso. Jade estava parado, analisando minha reação com um sorriso claro de orgulho. Ele me abraçou firme e tocou alguns galhos secos na parte de baixo da nova roseira:
- Não pude tirar essa parte seca! Era deixar assim ou correr o risco de todo o pé ficar bambo e cair com o vento. Sinto muito, Emery!
- Não se desculpe Jade! Você fez um trabalho maravilhoso com as flores!
-Mas a parte seca está deixando tudo feio e...
-Se não fosse a parte seca, todo o pé cairia, certo? Da mesma maneira que uma época triste em minha vida fez com que acabássemos juntos, o que está ressecado garante que ela viva. A vida de alguém é marcada por momentos bons e ruins, mas  do mesmo jeito que coisas boas nos tornam confiantes, as ruins nos fazem crescer. Pense nisso!
            Ele olhou nos meus olhos e sorriu. Beijou-me e inundou-me de magma de novo. Sentia o fogo queimando minhas veias, pensei que estava entrando toda em combustão, mas ele me segurava e me prendia a realidade mágica daquele momento! Trabalhamos bastante e voltamos após o almoço. Comemos bolinhos de arroz e alguns doces e resolvemos plantar algumas sementes de Dentes-de-leão.
Quando entramos no jardim, uma silhueta masculina brincava com as pétalas das orquídeas. Kentin...pensei, e antes que eu pudesse me segurar em Jade, ele se virou em minha direção , dizendo:
-Emery, eu preciso falar com você...



       Inkas me levou para casa e, agora, estava sendo cuidada por Marry e Vicky. Elas queriam passar diferentes quantidades de maquiagens e cremes para esconder os meus pequenos ferimentos, que não estavam nada bonitos. Mas eu recusei. Nunca gostei de me esconder por trás de pós coloridos e continuarei pensando assim. O ursinho que Ken me deu quando eramos menores estava enlaçado pelos meus braços; espremidos em meu peito e recebendo pequenas gotinhas de água que escorriam pela minha face.
      Emilly me olhava, aparentemente cansada de tanto acalmar-me,sem nenhum sucesso. Ninguem podia me ajudar a me tirar aquela dor de dentro do meu peito! Até que Marry,completamente frustrada, diz:
- Chega, Emery! Cansei!-, eu a olho, confusa, mas ela continua:- Você está fazendo muito drama! Ele foi o amor da sua vida, mas agora é hora de você superar e seguir em frente. Olha seu estado: Cortes, manchas e, se não fosse a Inkas, estaria suja e molhada! Erga a cabeça, agora! Você é uma garota,não um animal!
       Eu estava boquiaberta com aquele discurso. Ela estava certa e, sem dúvida, era muito mais do que uma garota superficial como muitos pensavam. Ela tinha o meu sangue e honrava isso. Me levantei.
- Você está certa, Marry! Não garanto que, quando encará-lo, serei firme, mas vou tentar, prometo! Mas me recuso a passar maquiagem. Não há muitas marcas no rosto, e posso por uma blusa de frio, ok?
-OK!- elas disseram juntas, após um leve suspiro.Logo após, terminamos de nos arrumar e fomos para a Sweet Amoris.

* horas depois*

        Estávamos indo para o ginásio na aula de educação física. Seria basquete, esporte que acho bem divertido. No momento em que fomos começar o jogo, o treinador gritou:
-Esperem! Emery, não pode jogar com blusa de frio.Regras da escola, pois pode atrapalhar a sua identificação pelos adversários. Peço que tire, por favor.
-Mas eu nao posso, treinador! Sinto muito- olhei para Marry, desesperada. Ela não podia me ajudar...
-Ou tira a blusa ou será suspensa de minhas aulas!
        Então, sem escolha, eu a tirei, revelando o que eu tanto escondia. Todos que estavam presentes suspiraram; o espanto iminente na expressão de cada um. Ambre, do time adversário, começou a rir, sendo seguida por suas amiguinhas venenosas. Eu ia chorar, eu DEVIA chorar. Mas não chorei! A promessa que fiz estava evaporando as lágrimas do meu rosto e transformando-as em ódio.Então eu ri, de maneira um pouco louca.
       Eu me dirigi a ela e parei bem a sua frente. Ambre não foi rápida o bastante para desviar da tapada que dei em sua cara, deixando marcas vermelhas de dedos finos e longos. Quando recuperei o controle de mim mesma e pensei no que havia feito, corri até o jardim, fugindo dos olhares atônitos que me seguiam. O cheiro da grama era mágico e curava toda a repulsa que exalava de meu corpo. Entre os arbustos e os coqueiros, Jade surgiu de maneira silenciosa, se levantou e sentou ao meu lado.
-Não precisa de dizer nada. Inkas me contou o que aconteceu ontem e, independente do que pode ter ocorrido hoje, quero conversar com você.
      Me curvei em sua direção, numa posição atenta a cada palavra que ele poderia  dizer.
- Emery, eu sei que não tenho muito jeito com as palavras mas...- sua voz travou,e, para disfarçar, tocou meus cabelos, passando-lhes pelas orelhas- ... gostaria que você soubesse que eu te amo! Que sempre quis encontrar uma menina assim, exatamente igual a você e,na medida que ficávamos juntos, me apaixonei cada vez mais . Eu também sei que você ama o novato mas espero que saiba que se um dia quiser me dar uma chance de ficar com você, estarei aqui... É isso!
        Ele se levantou e saiu, com  passos lentos e ritmados.Aquilo tudo me atingiu como uma flecha firme e pontiaguda, dilacerando meu estômago e me deixando perdida no ar. Mas eu sabia o que aquilo significava e fui dominada por um sentimento novo. Jade se afastou, mas corri em sua direção e segurei sua mão. Toquei sua face, retirando pequenos grãos de terra escura.
-Jade- olhei bem no fundo daqueles olhos claros e fiquei perdida na beleza de sua alma-, eu aprendi com a louca da minha irmã, que devemos superar a dor do passado e seguir em frente. Você é tão perfeito, combina tanto comigo... Se ao menos eu pudesse ser boa o bastante pra você e ...
-SHH!- ele me interrompeu- Emery, não percebe? O fato de você respirar a mesma magia que eu respiro e de  estar aqui comigo, tão perto, já te torna perfeita para mim. Eu te amo, Emery.
       E chegando mais perto daquele rosto, disse:
-Então Jade, prove!
         E ouvindo aquilo, ele me beijou. Meus lábios pegavam fogo e minha pele faiscava a cada toque. Estava mergulhada em magma e seus lábios se encaixavam perfeitamente aos meus, me fazendo segurar os seus cabelos enquanto ele abraçava minha cintura. Nossos dedos, aos poucos, se entrelaçaram e pude ver o quanto aquele beijo significava para ele... e para mim!
        Estávamos sem noção do tempo, perdendo minutos e querendo permanecer daquele jeito por mais alguns anos, mas deveríamos nos controlar pois, aliás, é proibido beijos na área da escola. Ele me abraçou forte e sussurrou:
-Namora comigo?
      E eu, ainda em êxtase com aquela explosão de emoções, falei, firme e claro:
- É claro! Seria maravilhoso!
    Peguei sua mão e, ouvindo o sinal de saída, fomos ao ginásio buscar a minha mochila que havia ficado para trás. Kentin e Ambre estavam encostados na entrada do ginásio, como se me esperassem. Ele acariciava seu rosto por cima da marca que causei, e quando virou para me encarar, se deparou com Jade bem ao meu lado, conversando e me ajudando a pegar o meu material. Eu não tive coragem para encará-los, mas sabia que, independente do que eles pensavam, eu estava segura ao lado do meu namorado de cabelos lisos e verdes... Eu seria agora, uma nova pessoa!

         Acordei trêmula e pálida devido ao frio. Estava assustadoramente escuro, a lua brilhava no céu vazio. Um céu tão vazio quanto a minha alma,pensei, e me levantei. Meu corpo estava dolorido, com dúzias de manchas avermelhadas e cortes superficiais, além de lama por todas as partes.
       Peguei meu celular no bolso, mas estava desligado e lotado de água. Obrigado, vida!, pensei, você realmente conspira contra mim. Sai pelo portão dos fundos que sempre ficava aberto e fiquei vagando sem rumo. Marry e meus pais não eram a opção mais agradável para me ajudar agora, mas eu sabia quem era... Peguei um telefone público e liguei a cobrar:
- Alô, quem fala?
-INKAS!! Graças a Deus você atendeu. Preciso de você, por favor, deixa eu ir para sua casa...- minha voz ficou presa entre um soluço de dor e as lágrimas.
-Emery,está tudo bem? Estou descendo e te espero na varanda. Vem logo!
        Ouvindo aquilo, deixei o telefone de lado e fui direto para a casa dela. Ela estava aflita, batendo os pés e correu ao meu encontro. Assim que me tocou, meus joelhos cederam e, se não fosse pelos seus braços, cairia no chão. Ela me levou a sua cama, tirou o meu vestido, colocou-me na banheira com bastante água quente e sentou-se ao meu lado.
        Envolvi os meus joelhos com os braços, preparada para ouvir uma bronca ou algo assim, mas Inkas estava em silêncio.Ela se virou e me encarou, atravessando  os meus olhos com suavidade e penetrando a minha alma com aquele olhar misterioso, que só ela podia fazer.
-Preciso saber de tudo para poder te ajudar.- ela disse, pegando uma gaze e limpando cuidadosamente os meus cortes,que levemente latejaram.
-Eu sei- disse e, suspirando, comecei.- Quando entrei na escola, era muito nova e, assim como hoje em dia,  tinha dificuldade para arranjar amigos. Eu estava sozinha no recreio, mas um garoto sentou-se ao meu lado e se apresentou para mim. "Olá! Sou Kentin, mas pode me chamar de Ken.", ele disse, e a partir desse dia, nunca mais nos separamos.
-Então o que aconteceu está relacionado a esse menino?
-Sim- confirmei e continuei- Quando descobrimos o que era amor e coisas do gênero, sabíamos que estávamos apaixonados, mas nunca tivemos coragem de assumir até que, um dia, eu resolvi contar a ele o quanto eu queria ser sua namorada, mas... Ele havia ido embora para o colégio militar.
- Então ele partiu sem dar noticias, te deixando para trás e seguindo com a vida.- Ela concluiu.
          Eu me enrolei numa toalha e Inkas me deu um pijama turquesa com pequenas rendas na altura do ombro. Quando me vesti, prossegui:
- Exato. Uma amiga me disse que, antes dele ir,havia avisado que, depois de 2 anos treinando com os soldados do colégio militar, ele iria para a Sweet Amoris, como o pai havia planejado.
- E ontem você o encontrou?:
-Sim- disse, soluçando e engolindo pequenas lágrimas salgadas.- Ele estava beijando a Ambre, e, quando me viu, disse que sou um "tipinho de garota que ninguém gostaria de ter"! Quando controlei meu corpo de novo, já estava correndo em direção ao parque.
         Deixei que as gotinhas de água que desciam dos meus olhos explicasses o que aquilo tudo significava para mim. Ela levantou-se e me abraçou, colocando minha cabeça debaixo de seu queixo:
-Vou te contar uma história, ok?
- Uhum.
-Uma vez, na China, um deus chamado Yuelao, para que pudesse ver um menininho brincando na terra, desceu da lua (onde morava), transformou-se em um velho e sentou- se perto do menino. Boa noite,ele disse ao pequeno garoto, que, ao vê-lo, ignorou-o e continuou a brincar. Você precisa se preparar,pois logo crescerá e casará com uma moça, disse Yuelao. 
      Meus ouvidos acompanhavam cada palavra que Inkas dizia, que logo continuou:
-Ouvindo isso, o menino disse que nunca iria se casar, mas logo foi interrompido pelo velho; Tem certeza? É o seu destino que decidirá isso. É a menina presa no final deste fio que será dona de seu coração. O menino olhou para o chão e viu, magicamente, um fio vermelho como sangue preso em seu calcanhar,ligando-o a uma menina na varanda de uma casa bem longe. Ele, assustado, pegou uma pedra e tacou com toda a força na menina e, logo após, saiu correndo, sem reparar na marca deixada na face da pequena garota. Anos depois, o garoto havia crescido e se tornado um homem com idade de casar, mas não achava ninguem ideal para ser sua esposa. Ele, desolado, passeava pela cidade anoite quando, na janela, viu a silhueta de uma garota e logo sentiu que estava destinado a casar com ela.- Inkas parou e me deu um sorriso fascinado.- Quando disse ao pai da moça que queria se casar com ela, ele, desconfiado, pediu que desposasse sua filha o mais rápido possível e, tempo depois, a moça foi se casar com ele, porém usava um véu negro sobre o rosto.
- E o que aconteceu no casamento?- perguntei ansiosa para descobrir o final do conto.
- Durante a cerimônia, ela não mostrou o rosto, mas quando estavam na lua-de-mel, ela permitiu que tirasse o pano, desde que não a humilhasse, pois era feia devido a uma cicatriz feita por uma pedra que recebeu quando criança. E ele logo lembrou- se do que ocorreu quando ainda era um garoto, e , quando viu a face da moça, achou-a ainda mais linda e percebeu que sem ela não viveria.
-Oh, Inkas,- disse, em êxtase com a perfeição da história- Você acredita mesmo nisto?
- Sim, Em's!  Mais cedo ou tarde, agente acha alguém que nos completa: que está amarrada do outro lado do nosso fio vermelho e reluzente. Esta é a lenda de Akai Ito.
        Deitamos uma do lado da outra. Estava feliz por ter Inkas comigo, sempre me protegendo junto com a Marry. Reparei em seus cabelos verdes, extremamente familiares. Ela me encobriu e fechei os olhos. Os pesadelos vinham, mas ela segurava minha mão firmemente e transformava todo o terror em paz. Perdi a consciência logo depois, me entregando a um mundo todo meu...


      Estava correndo loucamente pela chuva. Entrei no parque em poucos minutos e    corri mais ainda, fugindo dos olhos atentos que   podiam estar me vendo enquanto me dirigia à área dos pinheiros. Á medida que entrava entre as árvores pontiagudas, os galhos se prendiam no meu vestido e o rasgava brutalmente, além disso, por mais doloroso que fosse estar sendo cortada por espinhos de diferentes plantas, era bem mais agradável do que havia acontecido naquela manhã...

*flash back on*

      Quando cheguei na escola, tudo parecia comum e chato. Já se passou 1 mês desde que entrei na Sweet Amoris. Havia conhecido alguns garotos: Castiel, Nathaniel, Alexy e seu irmão, Armin, Jade, Lysandre... As meninas continuavam sendo as mesmas, exceto por Kim, uma morena linda de cabelos curtos e por Emilly, alta e magra, que se juntaram ao nosso grupinho de amigas.  Quando passei pela escada, Inkas apertou minha mão e me puxou para um abraço forte e firme. Ela era minha melhor amiga desde que o acidente com tinta vermelha ocorreu.
        O sinal bateu e fomos para a aula de matemática. Oprah, nossa professora, fazia diversas perguntas, na qual Inkas respondia rapidamente. Castiel olhava para a pequena garota de cabelos verdes e óculos do meu lado a cada resposta certa que ela dava. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde, aqueles olhares encantados seriam devolvidos na aula de artes, onde Cast Kun (apelido que a Emilly inventou), deixava Inkas admirada com seus desenhos tão perfeitos e simétricos.
         Na hora do intervalo, eu e Lysandre comemos alguns sanduíches no jardim, como sempre fazíamos. Era maravilhoso, e completamente viciante, ter o calor de sua amizade tomando conta de mim, como um irmão mais velho cuida de sua irmã menor. Ele sempre  me dava ótimos conselhos. Agora eu entendi porque Marry o ama tanto, e, sem dúvidas, sinto que é reciproco da parte dele.O sinal bateu e, bebendo um pouco de água, fomos para a classe.
         As últimas aulas eram de física, biologia e redação, na qual eu sempre deixo  nosso professor encantado com meus textos e opiniões. Quando fomos liberados de mais um dia de estudos, me despedi de todos e fui ao clube de jardinagem, pois me ofereci para ficar e  cuidar das flores recém plantadas. Jade me esperava com uma pequena pá e um regador na mão.
- Obrigado por me substituir hoje! Estou realmente ocupado demais para ficar após as aulas e...
- SHHH!!- digo, rindo e olhando-o amistosamente- Está tudo bem! Você sabe o quanto amo as plantas, portanto, adoraria ficar aqui sempre que possível. Fique calmo e deixa comigo!
         Ele pega uma pequena rosa, prende em meus cabelos trançados e sai andando na direção da portão.Mãos a obra, penso. Começo regando as tulipas, retirando os galhos secos dos arbustos, regando as orquídeas e adubando os morangos.
         Quando acabei, estava extremamente cansada. Lembrei-me do livro que estava na minha mochila, e já que o sol ainda estava iluminando bem, comecei a ler. Quando eram cerca de 6 horas, estava anoitecendo, então resolvi ir embora.Oh não, esqueci o meu livro!, penso e retorno a entrada do jardim para buscá-lo.
         Então eu os vejo.... Ambre estava fortemente presa aos braços de um garoto alto, beijando-o freneticamente. Ele a puxou para perto de seu corpo e, após vários minutos, perceberam que eu estava ali. Ambre começou a rir e  me mandar olhares debochados.
- Qual o problema, novata? Nunca beijou antes?
     Estava quase respondendo quando o garoto segurou-lhe a mão e disse:
-Não, Ambre, ela nunca beijou ninguém. O único garoto que teve coragem de beijá-la foi eu, mas muito tempo atrás, agora, aposto que ninguém quer saber desse tipinho de garota!
    Então eu percebo as mesmas luvas pretas e o mesmo colar que dei a Ken em seu aniversário, um ano antes dele partir. Meu antigo e primeiro amor. Ken... sussurro devagar, mas alto o bastante para que eles ouvissem.
-Isso mesmo! Agora estou mudado e...
         E antes dele terminar de falar, deixo tudo para trás e saio correndo para fora da escola, inundada pela minha própria dor e sufocada pelas lágrimas. Meu Ken, meu amigo e amado Ken voltou e... não consegui concluir a linha de pensamentos. Atravessei a rua e fui em direção a entrada do parque

* flash back off*
   
        Agora, tropeçando nas pedras, cai em uma poça de lama. Estava indefesa e  encolhida em posição fetal, como um bebê. Sentia-me imprensada, talvez pela chuva que me esmagava
ou pelo enorme peso nos meus ombros. Ver o amor de sua infância se agarrando com aquela víbora, beijando-a ardentemente, tocando sua cintura...
      Me levanto, com o joelho ralado, e sento no banquinho. Agora, as gotas de água estavam começando a sumir e um pássaro começou a cantar. Vai pro inferno!, pensei. Estava cansada e me deitei naquele mesmo lugar, esperando que, no dia seguinte, acordasse na minha cama; despertando de um pesadelo...

        O que você está fazendo? São apenas algumas garotas, não monstros. Saia dessa sala e vá para casa antes que perca o ônibus, ordenei a mim mesma antes que alguém me visse agachada naquela posição constrangedora. Eu sabia que, caso ela quisesse me bater, eu poderia correr, pois, aliás, estou de tênis de corrida e Ambre usa aquele sapato de salto plataforma beje, mas creio que ela não ousaria me agredir.
         Respirando fundo, atravesso a porta e abro os olhos; Não havia ninguém no corredor! Paranoia?, pensei, mas sabia que elas estavam lá e era apenas questão de tempo antes que aparecessem de novo. Para confirmar minhas teorias sobre os meus tênis serem realmente esportivos (e já que perdi o ônibus e meu pai já buscou Marry), experimento ir para a casa caminhando.
          Quando cheguei, olhei no relógio e demorei mais de 1 hora para chegar em casa. Creio que não vou repetir isso tão cedo. Marry estava preocupada e contei-lhe o que havia ocorrido.Ela dividia um ódio por Ambre desde que entrou no colégio, e afirmou  que eu deveria ir com ela para a escola no outro dia. Mas eu neguei, afinal, não queria afetar a reputação que minha irmã demorou para conseguir com uma bobagem dessas.
         No dia seguinte,quando desci do ônibus, estava relativamente calma. Quando estava atravessando o mais rápido possível o pátio, notei um pequeno palco cercado por algumas pessoas.Quando estava me afastando, alguém com uma máscara estranha e roupas coloridas me puxou para cima, de maneira que não pude evitar ficar na frente de todos os alunos da Sweet Amoris.
          Era tarde demais... quando reconheci o cabelo cacheado e loiro por trás da máscara sorridente, um jato enorme de tinta vermelha me atingiu e me deixou imunda na frente de todos da escola. Todos começaram a rir, e sai correndo, chorando e tropeçando nos meus próprios pés. Quando tive coragem para abrir os olhos, estava deitada no jardim, colorida e suja dos cabelos aos pés.
          Não podia matar aula, mas não havia a menor possibilidade de voltar a classe dessa maneira. Estava tão assustada, pois a humilhação havia sido horrível,  que, entre soluços e lágrimas, mal ouço uma voz:
-Ei, você está bem? Sou Bella, e vim ver como você está...
-OW, obrigada!- digo tentando me acalmar- Sou Emery, irmã da Marry. Muito gentil da sua parte!
-Não é nada- ela senta do meu lado e coloca as mãos nas minhas- Foi horrível o que elas fizeram, mas eu tenho algumas roupas extras, se você quiser! Eu falo com o nosso professor, já que sou da sua turma, enquanto você troca de roupa! Aproveite e use o banheiro do ginásio, tem um chuveiro ótimo!
-Seria ótimo, obrigada! Ate´logo, ok?
-Ok, boa sorte!
            O ginásio tinha um banheiro pequeno, mas perfeito para que eu possa me arrumar. Quando tiro a tinta do cabelo e termino o banho, dou uma olhada nas roupas que Bella me emprestou e me espanto. Era uma blusa preta decotada em "v" , uma calça extremamente justa e um sapato de cano alto azul e salto; Arrasador! Me perguntei qual o motivo de alguém aparecer do nada e ter roupas extras para emprestar, mas decidi que era apenas bondade da parte de Bella.
       Quando terminei de amenizar o estrago, sai em direção a classe. Enquanto andava pelo corredor, mal pude deixar de notar os olhares vindos de todos os alunos presentes. Primeiro, pensei que deveriam estar rindo de mim por causa do que havia ocorrido, mas os garotos mais velhos do terceiro ano, que estavam no intervalo, olhavam fixamente para mim, e percebi que estava um pouco... sedutora demais, mas era isso ou andar manchada de tinta.
          Quando entrei na sala de aula, vários olhares arregalados se formaram, mas eu segurei a risada, aliás, sou apenas uma novata. Era estranho ser o centro das atenções, mas a sensação de ser admirada era muito boa e viciante. Meu lugar estava ocupado, então sentei atrás de um garoto muito bonito, com cabelos lisos brancos, pele morena e ensolarada, além de olhos maravilhosos de cores diferentes. Assim que me sentei, Ambre entrou na sala, sozinha, e quando me viu nos novos trajes, soltou um pequeno grunhido de raiva e apertou as unhas rosas nas mãos. Não pude evitar de sorrir maliciosamente para ela e mandei um pequeno "olá" com as mãos. Aposto que foi castigada pela atitude, mas quem a havia denunciado para a diretora? Não importa afinal, já que ela teve o que merece.
          Além disso, se ela quer guerra, é isso que terá! Olho Bella e Marry, sentadas uma atrás da outra, e dou uma pequena piscadela. Aposto que este ano, muita coisa irá acontecer...

          Entrei em uma sala amarela e vários alunos já estavam sentados em seus lugares, mesmo faltando bastante tempo para que a primeira aula se inicie. Havia uma garota com cabelos verdes e curtos, mas enquanto reparava em seu vestido claro, uma outra, de cabelos lisos e castanhos, me tocou no ombro:
-Olá, sou Emilly. Tudo bem? É novata?
-Oi, sou Emery. Estou bem, obrigada e você? É, está tão obvio assim?
-É, está!- Ela para e da um sorriso grande, mostrando covinhas meigas e similares- Ainda temos bastante tempo, quer dar uma volta na escola?
-Claro, seria ótimo! -digo sorridente. É ótimo já ter arranjado alguém para me fazer companhia.
            Ela me segura delicadamente com as mãos e me conduz por um corredor estreito e bem iluminado. Quando percebo, estamos em um jardim maravilhoso e passo as mãos diante de uma fileira de rosas até que vejo Emeries, uma espécie de flor rara que deu origem ao meu nome. Elas são frágeis, por isso não as toco, mas consigo sentir seu aroma adocicado. Emilly é realmente incrível, principalmente quando eu a ouço recitar maravilhosas poesias escritas por ela mesma.
            O passeio estava maravilhoso e estava me divertindo muito quando ouvimos o sinal bater. Perdemos a noção total do tempo e estávamos tão longe da sala de aula que começamos a correr pelos corredores até que esbarro em uma garota com um copo na mão. Seus cabelos loiros e cacheados ficaram repletos de um líquido vermelho, sendo impossível evitar pequenas risadas.
-QUAL É A GRAÇA?- ela diz, mantendo uma distância definitivamente perigosa.
-Nenhuma, desculpe! Não foi a minha intenção...
-Intenção? Eu deveria era te dar uma surra, peste!- disse, ficando extremamente nervosa.
-Surra? Não ouse encostar a mão nela, loira oxigenada- disse Emilly, envolvendo meu corpo de maneira protetora- Foi apenas um acidente!
           E antes que a loira, cujo nome descobri que era  Ambre, conseguisse responder, um garoto ruivo entrometeu-se na conversa e disse:
-Isso vai ter que ficar para depois, Ambre. A aula vai começar e você vai se atrasar. Seus pais não vão gostar de receber um ligação da diretora apenas por um imprevisto estúpido!
Ela olhou para os olhos dele e lentamente saiu acompanhada de outras duas garotas, que seguravam uma bolsinha transparente lotada de maquiagens, em direção ao banheiro.Provavelmente, deve ter ido tentar amenizar o estrago. Ele, ao perceber que a briga havia acabado (por enquanto), foi embora caminhando lentamente, mas não pude deixar de perceber a maneira em que ele olhava para Emilly. Quando olhei para ela, suas bochechas estavam coradas e logo deduzi que era recíproco; mútuo.
           E diante todo aquele clima, percebi que estávamos atrasadas e logo puxei-a para dentro da sala. Felizmente, o professor estava ocupado demais para perceber a nossa entrada silenciosa, o que me deixou realmente aliviada. Perder aula era inaceitável para alguém como eu. Quem dava aula era um homem alto e magro, com óculos e a cabeleira desarrumada. Do outro lado da sala, pude sentir o olhar de desaprovação de Marry em minha direção. "Do que seria da vida sem as suas loucuras?", ela mesma disse quando foi escondida em uma festa quando tínhamos 13 anos.
           A aula fluiu muito bem, A garota de cabelos verdes se chama Inkas e a de cabelos laranjados é a Íris. Estava saindo da sala quando vejo Ambre estendida ao lado de suas "amigas" bem na porta. Aos pouco me aproximo e ouço-a dizer:
-Agora aquela garota vai aprender que não se joga suco em alguém do meu nível.
     Meu sangue congelou nas veias. Inkas e Emilly já haviam ido embora para pegarem um carona com os pais de Íris, então o que eu faria? Aos poucos, escorreguei pela parede até estar sentada no chão gelado, com os braços em volta dos joelhos, torcendo que alguém apareça e me tire daqui, sã e salva...


          Quando acordei, a cabeça de Marry estava na minha barriga, subindo e descendo, acompanhando a minha respiração. Seus cabelos, mais claros que os meus, estavam desalinhados por todo o meu corpo. Desde que nossos pais se separaram, fomos obrigadas a esquecer a ignorar a existência da outra, mas agora que nossa família está reunida de novo e permanecerá assim, passamos toda a maior parte dos nossos dias juntas; recuperando o tempo perdido.

        Marry e eu não somos tão diferentes: Ambas possuímos cabelos longos , olhos com um tom perfeito entre o cinza e o preto. As únicas diferenças são que Marry é extremamente popular devido a sua personalidade extrovertida e engraçada, enquanto eu sou um pouco mais quieta na presença de estranhos.Além disso, ela sempre está usando roupas da moda, e eu me preocupo apenas com bons e velhos moletons. Já que eu e meu pai nos mudamos de outra cidade  para a casa de minha mãe, serei uma novata na escola de minha irmã, a Sweet Amoris. Estou ansiosa!
     Para o primeiro dia de aula, decido por uma blusa branca e um jeans escuro, afinal, estava indo para o colégio, onde o meu cérebro vale mais que a minha beleza . Enquanto penteio os cabelos, Marry aparece usando um vestido preto curtíssimo com um coração desenhado bem no meio. Com meias listradas até o joelho, parecia uma super-star indo para um show lotado de fãs.
-Quer ajuda com o cabelo?- diz, aproximando de mim e estendendo as mãos para pegar o pente de minhas mãos.
-Seria ótimo, obrigada! Você está linda, como sempre, enquanto eu sou como o patinho feio.
-Pelo menos deixou de lado o moletom marrom e pegou algo mais decente. Por que não quer usar uma das minhas roupas? Ou não usa um dos maravilhosos looks que desenhou no seu caderno?- era possível ver as rugas de dúvida aparecendo no seu rosto belo e suave, mas dei a mesma resposta que dou há anos:
-Por que eu sou o cérebro da família enquanto você é a beleza!- Peguei minha mochila e desci as escadas, dando um fim a conversa antes mesmo de Marry procurar por explicações.
      A viagem foi tranquila e calma. Meu pai levou Marry de carro, mas eu preferi pegar um ônibus. Não gostava de usar roupas bonitas porque elas me lembram o Kentin. Nos conhecemos quando eu tinha 2 anos de idade e, desde então, eramos amigos inseparáveis. Ele era baixinho, usava o cabelo franjado, óculos grandes e redondos e sempre era alvo de brincadeiras de mal-gosto. Mas eu o amava. Sempre tive vontade de dizer o quanto eu queria ficar presa naqueles braços carinhosos, mas, quando eu tomei coragem para dizer o que sentia, ele não apareceu na escola. Descobri dias depois que ele havia decidido passar dois anos no colégio militar antes de ir para outra escola, que é, por coincidência, a mesma em que estou indo neste exato momento. Creio que esses dois anos já se passaram, então tento manter o mesmo estilo que tinha antes de que ele fosse embora...
      Quando desço, me deparo com um prédio enorme cercado por dois outros menores cor de rosa bebê. Um jardim de pequenas plantas rasteiras de estendia até uma porta de vidro dupla. A calçada é de pequenas pedras amarelas perfeitamente harmoniosas. Mova-se, penso, tentando ignorar os olhares distorcidos que já vinham em minha direção. 
     Vejo uma garota passando e resolvo segui-la. Ela atravessa um pátio lotado de estudantes com roupas coloridas e, sem dúvida, muito mais estilosas que a minha, me fazendo parar e decidir ir pelo outro lado. Imersa em pensamentos, acabo encontrando enormes portas brancas, que logo abro e entro, rumo a algo novo e desconhecido...
         

Welcome

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Bem- vindos ao meu pequeno mundo *-*

Sobre o Blog

" História de uma docete é apenas um blog que dá asas a minha imaginação. Cada personagem possui uma pequena parte de mim, independente se é boa ou ruim. Sempre abordo o amor, o ódio, a dor, o medo e a amizade quando escrevo algo, pois são fatores que estão constantemente presentes em nossas vidas. Acho maravilhoso abordar o que é recíproco ou não, e por isso, garanto que este blog será um cantinho no qual iremos nos apaixonar cada vez mais!"
-Emme